Se os aromas e sabores de um vinho são mais comparáveis a uma pintura, então os taninos são mais comparáveis a uma escultura. Ao contrário dos primeiros, mais etéreos e distantes, os taninos têm uma presença táctil, física, de proximidade. Daí serem descritos como algo tridimensional.
De acordo com o vinho, ora são descritos como ‘redondos’, ora como ‘angulosos’, ora como ‘robustos’. Também podem ser ‘ásperos’, ou ‘macios’, ou até ‘aveludados’.
Todos estes adjetivos remetem para algo com volume e textura - tal como uma escultura. Mas o que são os taninos e como esculpem a paisagem sensorial de um vinho?
Os taninos são compostos naturais presentes no chá, no café, no cacau, nas nozes ou nos mirtilos. Na realidade, estes compostos polifenólicos estão presentes em virtualmente todas as espécies de plantas.
A origem etimológica da palavra remonta ao termo latino ‘tannum’, a casca de carvalho triturada empregue no curtimento do couro.
No vinho, os taninos advêm principalmente da pele, das grainhas e dos engaços das uvas. Também se encontram nas barricas de carvalho onde muitos vinhos envelhecem.
Entre muitas outras funções, os taninos servem para proteger as plantas contra pragas e doenças.
De modo a garantir a propagação efetiva das sementes, a adstringência dos taninos também impede que as aves comam a fruta antes de esta amadurecer por completo.
Ora, ‘adstringência’ é aqui a palavra-chave. Também com raízes no latim, a palavra indica algo ‘que aperta’ ou ‘que contrai’.
Este ‘aperto’ no palato é exatamente o travo seco e firme que nos leva a rejeitar de imediato a fruta não amadurecida. Mas o que poderia ser uma sensação negativa foi sabiamente moldado ao longo dos milénios para amplificar o prazer na degustação de um bom vinho.
Esta amplificação do prazer é veiculada de vários modos. Tal como a pedra de mármore numa escultura clássica, os taninos servem para formar a estrutura de base onde a arte se revela perante os sentidos.
Além desta estrutura de base, os taninos também fornecem coesão e textura aos vinhos: com efeito, a ‘pedra’ pode ser trabalhada com superfícies mais lisas – tal como sucede nos vinhos mais suaves – ou com superfícies mais rugosas e onduladas – tal como acontece nos vinhos mais tânicos.
Em conjunto com a acidez, a doçura e o álcool, os taninos contribuem depois para o estilo e equilíbrio entre diferentes elementos.
Por exemplo, a firmeza dos taninos fica usualmente acentuada nos vinhos com acidez mais viva; ao invés, uma elevada doçura pode servir de contraponto à aspereza dos taninos mais firmes e contribuir para que o vinho adquira suavidade.
Por fim, em sinergia com um teor alcoólico mais elevado, os taninos tendem a exacerbar a perceção de corpo e volume do vinho. Vinhos com maior teor de álcool e de taninos são, portanto, sentidos como mais cheios e opulentos.
À medida que um vinho envelhece, os taninos acabam por se ligar entre si para formar moléculas maiores. Designado de ‘polimerização’, este processo leva a que os vinhos envelhecidos se tornem mais suaves e menos adstringentes.
A interação entre os taninos e o oxigénio também contribui sobremaneira para a evolução dos aromas, sabores e texturas durante o envelhecimento.
Mas o papel dos taninos não se esgota aqui, já que contribuem igualmente para a estabilização da cor durante a fermentação e envelhecimento. Além disso, ao atuarem como conservantes naturais, os taninos dão longevidade ao vinho.
De facto, juntamente com o álcool e a acidez relativa, os taninos são um dos fatores mais relevantes na determinação do potencial de guarda. Tanto assim é que, na França do século XVIII, os vinicultores e comerciantes usavam o travo dos taninos para avaliar a qualidade e potencial de envelhecimento do vinho.
Curiosamente, este rudimentar ‘teste de taninos’ levou alguns comerciantes menos escrupulosos a adicionarem ao vinho aparas de carvalho - e até cascas de árvores - com o intuito de aumentar artificialmente o teor de taninos. Este episódio ilustra o quanto os taninos eram percebidos como indicadores de valor.
Na vinha, os níveis de taninos variam consoante as castas, o terroir e as condições de cultivo.
Como expectável, diferentes castas apresentam diferentes concentrações de taninos. A Baga ou a Touriga Nacional são notórias pelos seus altos níveis de taninos, ao contrário de castas como a Arinto ou a Fernão Pires.
Tal não surpreende, dado que os vinhos de castas tintas são particularmente ricos em taninos graças ao seu contacto prolongado com a pele das uvas durante a fermentação.
Porém, mesmo quando se trata da mesma casta, as uvas de regiões frias costumam ter taninos mais intensos e angulosos, enquanto as de climas quentes tendem a gerar taninos mais suaves e redondos.
A concentração de taninos depende ainda do grau de amadurecimento das uvas no momento da colheita – quanto mais amadurecidas, menores as concentrações.
Por oposição, os taninos são usualmente mais abundantes nas uvas nascidas a altitudes elevadas ou a latitudes baixas. Nestas duas situações, a elevada irradiação solar das vinhas leva a que as uvas se protejam melhor com taninos adicionais.
E, é claro, os enólogos também cinzelam a estrutura tânica de acordo com as suas escolhas estilísticas. Esta estrutura pode ser modelada através de várias técnicas tais como a fermentação com engaços, a maceração prolongada, o envelhecimento em carvalho, a micro-oxigenação ou o manuseamento da temperatura.
Os taninos são fundamentais na definição do carácter, origem e estética sensorial dos vinhos.
Por exemplo, do ponto de vista histórico, os vinhos do Dão têm sido distinguidos pelos seus taninos finos, elegantes e bem estruturados. É o que sucede em vinhos como o Quinta da Alameda Parcelas.
Já os do Douro são apreciados pela sua robustez e concentração, enquanto os do Alentejo são conhecidos pelos taninos maduros e redondos.
Ao apreciar qualquer uma destas opções, pense nos taninos como estando mais ligados à textura e estrutura do vinho do que aos seus sabores e aromas. E pense em todos estes diferentes elementos como partes interligadas de uma experiência artística.
Porque, afinal, o vinho é também uma forma de arte.